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DANÇA - CARMEM JORGE

O trabalho em dança de Carmem Jorge We Cage com duplo ou mais sentidos está estruturado em John Cage que desde 1944 produz performances sonoras. Um desejo de aleatoriedade, de que a música pudesse propor todos os movimentos possíveis e se relacionar com o público em sua apresentação cênica.
Nietzsche em su Nascimento da Tragédia no Espírito da Música já estabelecia alguns pontos que se referem a essa presença antecipada da música na festa dionisíaca. O envolvimento espetáculo com música e artes cênicas foi muito estudada por Wagner que chegou a elaborar um teatro onde ocasionasse essa integração. Erwin Piscator chegou a realizar experiências cênica teatrais envolvendo o público com cinema, movimentos das cadeiras, música e teatro, e isso nos anos 30.
Depois da corporificação do clássico com Lully e a compreensão de que o público deve estar integrado ao sentido teatral, Brecht propos um Teatro Épico, interrompendo o estado de bem-estar acomodado do público em relação à pulsante ideologia artística que se revelava na apresentação teatral. As interrupções possibilitavam que o público antevesse a maquinaria cênica, a presença do ator como alguém ali, no ato, ocasionando definitivos cortes emocionais em contrapartida de um momento crítico em relação à atividade artística que se desenrolava.
Dança teatro, e teatro dança. Butô, uma ação quase que mística da integração do sujeito bailarino com o objeto promove ainda hoje uma sensação no público de perfeita harmonia entre coisa e pessoa, entre movimento e música.
A apresentação de We Cage traz esta percepção de que o aleatório deseja acontecer num espaço determinado para as ações delineadas em formas pré definidas. O uso da tecnologia que envolve os ângulos da expressão corporal em dança dos bailarinos com câmera, e outros elementos que acondicionam tecnologia de imagem e som. O espaço do teatro Cleon Jacques no Centro de Criatividade produz uma amplidão agradável que, ao mesmo tempo posiciona o público em grande proximidade com a ação dançada.
A construção do esqueleto no espetáculo traz essa vontade de ritualizar a existência, de que há uma busca de se solucionar pelas marcas do andar humano (o entendimento da finitude humana a cada movimento), a arte, a natureza, e a dificuldade de interrelação com o real.
Construído o esqueleto finda o espetáculo. A alegoria da vida e da morte. Uma ritualização que se esparge no espaço elaborada em pouco tempo de roteirização coreográfica e ensaios.
A utilização do chão como princípio do crescimento humano, o desenvolvimento e a morte ou a pós-morte.
Os temas são sobrecolocados difundindo uma expectativa no espectador participante.
Busca de integração com a platéia, formas do contemporâneo retomadas, sonoridade eletro acústicas, primais, jogo sonoro como que houvesse um valor a cada momento em que se aciona um botão digital, a abertura do lugar com a presença dos técnicos e a suíte, a atuação de contra regragem que a própria coreógrafa auxilia em pôr e tirar os materiais computadorizados nas bailarinas. Enfim, toda a estrutura apresentada numa coreografia codificada em busca de comprimir sentidos.
Deve ser visto, e aguardamos mais.


ESPETÁCULO
We Cage

Centro de Criatividade de Curitiba
Teatro Cleon Jacques




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