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Coisas de passagem





    


    E claro que, se as coisas comuns fossem belas, a raridade seria a punição do bem, sim por que não caberia entre quantidades de óbvia beleza, e porque sofrer qualquer nuance; forma que se destaque, previamente a nulidade garantida pela imensidão do mesmo. A obra coletivo de um todo unitário, fabricado sob a ordem 

    O acaso é sempre interrompido, o estranho recuperado como novidade, a diferença ou o contraste como um depósito em que, a qualquer momento se torna domestico.


    Um treino forçado para que a absurdidade do estranhamento; que se revele já, até às entranhas como um derrisório objeto de permissões, de aceitações, mesmo que se obrigue a ficar no banco de trás do coletivo, seja de vez inteiramente apropriado, homogeneizado, destampado de sua condição. Coisa de longe, coisa do mato, fora do espaço escravagista da cultura que opera no domínio das coisas, que não mais selvagem, nem mais arbitrário de um acontecimento milenar, de uma natureza audaciosa.

    As diferenças assombram até o momento de serem etiquetadas, postas na caixinha, casinha, no frasco da solução do tudo-bem, café-com-leite.


    Há muito que pisamos sobre o desconhecido, amassamos o seu passado, marcamos a nossa jornada por esses nadas, que mal sabemos porque estão ali, por que não há rua pavimentada, um design de irmandade, de co-semelhança, de proximidade nas formas, de que parece com o que parece ser, e que se digne a se manter assim.

    Esses seres de almas inóspitas que berram as falas sabidas,  essas pragas daninhas, todas as sete, expulsas do paraíso ostentam seus jardins exóticos, demonstram um estado de posse, proto-aristocratas, que rasgada as mãos, mostra o sangue azul de uma nobreza merecedora. Essa ventura de querer acaba em mim, eu que descubro o descoberto, vejo sem nome, por minha ignorância - única estrada do saber esse arbusto, esse disforme perfeito, a coisa arrastada até um artifício técnico, na mira e dispare, apenas para o aproveitamento, para dizer que me encanta, que me alça em tudo esse desencontro. E por que sinto isso? E quanta besteira de amar o prodígio, a luz no meio do capim. Que ridículo sou em me apossar do que está perdido, como ouso habitar no conforto cansativo dessa liquidez comportada, estrita e civilizada, ilhado, tendo de ouvir os tronos ríspidos do que é explícito, do que seja manifesto.

    E se me vêem, atacam com o chicote dos cílios, e se continuo catucando os matos, mexendo nas pedras dormidas, despertam como controladores do mundo, os últimos acadêmicos da ecologia humana. Falam de boca fechada, gesticulam um não sei quê, riso de desafora, algo que importuna. E não que seja um controle, mais que se apresenta como orientadores intelectuais da propriedade com mais acabamento, com mais altura, melhor ajuste. É de lá, da poltrona mental de onde querem assear qualquer variação que não os reconheça que esbravejam na voz dura, com o talo da língua nos dentes, a cara no chão, no calcanhar batido, enfiando as contas na mão pesada. A sujeira da diferença requer higienização e limpeza diária.

    Não me levanto de onde estou, nem quando empurram a unha, “ô, aqui é propriedade privada”. E já fui ao banho, e estou com a calma deitada ao meu lado. A venda do corpo, meretriz do mérito, a proceder conveniente, os modais da respiração aflita, o tom das intenções, passam por mim como arames farpados, em rolo, descem as cercanias das evidências.

    Diz nada, fala nada, anda por nada, nada nos passos, e prossegue. Adianta-se, desaparecem os monturos urbanos organizados, as latas reviradas das discordâncias, os vales cheios de fome alimentados pela improbidade.

    A natureza do desenho arrumado, tão limpo, certo em tudo que cansa ver, morre antes de chegar, tecnificado, cópia estruturada, amontoado justificativo das comparações, das analogias.

Com outro impulso, de me esconder em mim, mais as medidas se acercam, por isso me contamino com o que não conheço, adoeço por saber, o que não existe persiste.

    É o que me entreva, que me ilumina, sombra profunda das coisas rasteiras. Vazio onde o significado não chega, e se obriga dar sentido ao não-visto, e nomear o inexistente, de beijar o pueril, o efêmero, apertar nos braços algum filho do tempo, alguém que escapou do mundo esquadrejado.

Sim, sair de si, cair fora que é ao mesmo tempo aceitar o bicho, a morte certa, e a única vantagem de não conhecer os conhecidos, sem precisar dizer olá, cumprimentar à distância, apenas vagar, vagabundo das travessias, sumir que aqui significa ancorar fora.

No fim, sei bem, acabamos catando cavaco no mesmo tacho.


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Charlie

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