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Meus pensamentos não me pertencem

 




Se alguém pensava que o que pensava pertencia ao seu pensamento, uma propriedade única. Hoje, talvez não tenha perdido o que foi pensado, quem sabe, descobert​​o que o pensamento parte do lugar onde se encontra. Você pode pensar assim também. Mas todo pensamento não suporta a intervenção absoluta do mundo, todas as mínimas coisas e a imensidão que se transforma. 

Somos pessoas que compartilham. Muito do que pensamos está em nossa estrutura orgânica, presente em nossa percepção, desde nossa herança biopsicológica, constituída pela experiência cultural social, filogenética.

Vemos algo e damos uma medida, antecipamos nossos passos seguindo o caminho solar, nos integramos com o gesto de outro, um sorriso, um bocejo que atua sobre nós e interfere diretamente em nosso comportamento. Mas o que nos faz alguém em processo, o que nos leva a conhecer e compartilhar é a vida social, somos seres gregários, vivemos em redes de relacionamento sempre abertos.

Cada um de nós no conjunto global, a totalidade de todos, busca atuar sobre algo, permanecer intrigado, procurando resolver questões, atuar com mais eficiência, com respostas a toda espécie de questionamento, e isso exige conhecimentos ulteriores que são modos de compartilhamento do saber que nos retorna através de um grande arranjo sináptico para que possamos, de muitas maneiras, acessar os sinais que nos levam a corresponder a esses saberes.

O conhecimento pode ser um segredo, um bem que se guarda, porém, mesmo assim ele é potencialmente uma linguagem do saber possível, é ainda uma ética do porvir quando será redescoberto, compartilhado. Nada que o homem possa fazer se mantém na vida de uma só pessoa. O conhecimento salta além das fronteiras de seu criador. A obra de arte não pertence mais ao artista, pode ter seu nome, sua assinatura, presente no teatro, no cinema, na galeria, no entanto, a arte é um bem social.

As ditaduras lutam com muito empenho contra a arte, o populismo a usa para a suas mensagens de controle, moralistas, os governos liberais, tidos como democráticos e os demais todos a tratam como um objeto, um bem, um ato humano que pode ser controlado, pode ser negociado, modificado, interferido, eliminado, destruído ou sujeitado. Apesar de inúmeras histórias contadas, que elas pronunciem o fim da arte, que as incendeiam, ponham fora, escondam, assim mesmo, a memória social persiste, assim mesmo, agora ou depois, no atelier ou na caverna ela se apresentará. Isso porque se faz como a ubiquidade do conhecimento humano.

E o conhecimento não pertence a quem conhece. Sempre somos seres de compartilhar. Mesmo que de forma aparentemente contrária aos valores comunitários, tantas vezes de forma egoísta, ou com um comportamento fora do habitual, diferente, ainda assim buscamos entender. E buscar entender o outro é o salto ético-moral que diz nunca estarmos sós. Algo valioso ainda persiste.

Nós somos seres que persistimos em manter a totalidade com todo o potencial, vemos a miséria, a fome, a exclusão, a crueldade os desenganos sociais, e, no entanto também vemos as forças pacificadoras, afetivas, como que uma taxonomia, algo que se impõe contra toda malignidade, um bem cultural social que move suas forças para que de algum modo estejamos ligados, unidos socialmente.

Há um motivo biológico de nos mantermos ante tantas diferenças e complexos sistemas excludentes, algo que vêm desse caminho filogenético, como que um ato-reflexo, como que inerente à espécie humana. Ninguém pode estar fora do círculo do conhecimento, do saber viver por compartilhar. Somos colaborativos, somos seres da alteridade, nos identificamos com o outro, nos integramos.

Há mais empresas e negócios para os cuidados humanos do que todos os empreendimentos dilaceradores da raça humana. O mais abrangente empreendimento humano, sem definitivo interesse é a expressão criativa, a arte. Significa mais que uma forma estruturada de ideias em símbolos, é desde a sua origem fazer algo por ação, atividade.

A realização de uma obra artística exige, em um mundo devoto a prosperar, a ganhar, uma luta maior, uma comprovação diária sobre a necessidade da arte. E isso significa uma vida artística sob pressão. Mover montanhas através desse pequeno ato humano, esse grão de mostarda. É um movimento interno-externo que busca levar, a todos, compartilhar um saber que de tal forma, além do mecanicismo das lógicas matemáticas, e através delas também, ultrapassar um racionalismo de validades tangíveis, de um racionalismo definido, de uma funcionalidade e utilidade de uso.

O artista necessita dessa luta, dessa pressão, de estar a seu modo focado, atento. É o guardião sensível da espécie humana, o mago das vontades quietas, percebe os movimentos da vida, da potência transformadora do homem. Os artistas nos dão o sinal, indicam caminhos, por isso pressionados, por isso empoderados a tomar a decisão ética de realizar a obra artística. Provocar, possibilitar o salto qualitativo sobre o mundo derrisório e finalista, tecnicista em suas moralidades.

Certamente, se concentrar é de tal maneira ser premente, que o que colhemos do mundo com o que pensamos em dado instante tentamos sustentar no intuito de que seja massivo, integral, mas isso não acontece se não colocarmos em prática o pensar, isso porque somos todos volúveis, a nossa atenção entra em paridade, faz jogos com todo o nosso aparato sensorial na construção do pensamento, e é por isso que é variável, e é por isso que a memória é plástica.

O pensamento artístico é sempre cultural social, está imerso nisso, buscando o seu salto material em que possibilita a transcendência do usual, da vida cotidiana e comum. A memória artística, proveniente de memória emotiva, entre fases e períodos vividos, de afetividade. É a memória recomposta, reconstruída, retomada que transborda em sentimentos.

Não há uma sala de guardados, gavetas onde as nossas lembranças ficam massivamente definidas. Somos seres do esquecimento ou do enriquecimento de nossos conhecimentos, do que a memória se faz em vários pontos de nosso cérebro e no voo intangível de nossa mente. Pensar é ganhar e perder ao mesmo tempo.

Toda pressão nas teias internas, nos traços sinápticos podem ser modificados, o processo de pensar, a memória que se estabelece no pensamento a faz deformar, modifica o tecido e não suas tramas. Como que saltos qualitativos vão se produzindo, e se realizam de muitos modos, como que esses entrelaces sinápticos pudessem abraçar, juntar um corpo, como que uma rede que se veste dessa estrutura massiva,  e se pode imaginar uma estrutura, uma forma que se avoluma nesse enredamento de acontecimentos.

Esse volume que nos indica que a rede apanhou algo, e a forma mostra sua característica, isso faz com que percebamos que se trata de uma memória integral sobre algo, se assim fosse. Nós dispensamos esse objeto, essa objetivação memorial, dissolvemos essa proto-materialidade lembrada em inúmeros segmentos. Se aguardássemos em nossa memória todas as formas, todo visto nessa rede sináptica, de tal forma integrada, pensaríamos em complexos definitivos.

Não haveria a espécie, seríamos unitários fisiológicos, ignorantes profundos, dispersos no reino da individualidade absoluta. Seria a individualidade que assiste à massa ígnea de mundos próprios, únicos da qual se existiria auto falante, auto entendível, auto suficiente, auto centrado e jamais precisado de outras mentes, ainda mais de mundos diferentes.

E se esse ser singular de fato fosse de alguma forma alguém que tivesse o atributo de pensar, a tal ponto que um tal pensamento criasse o mundo pensante, teria ao menos a companhia de mundos diferentes.  E esses mundos seriam o retorno do pensar, isso porque se compartilha o saber fugindo do individualismo cerrado sobre si mesmo. Ninguém está só, somos povoados de conhecimentos compartilhados.

Mas se pudéssemos ser únicos em nossa unicidade de um Eu integrado, cada coisa pensada seria um objeto-objetivo do real, uma realidade final. Vai que é disso que o estruturalismo se apegou, apertou, ou fez pesar na consciência um saber, mesmo que não de todo claro, em que se pode ver a massa informe que se processa no pensar. Um pensar único em meio a mundos diferentes.

Pensaríamos em nós o que no mundo que quase de todo desconhecemos, sabendo apenas que estamos nele em meio às diferenças, a espaços ramificados mundanos. Mesmo que falemos de um Eu absoluto, falamos no plural, porque não existe este ser no mundo. Trata-se de uma abstração.

Assim como que sejamos seres em transformação, - retomando o logos hieraclitiano vital, a passagem indistinta da força ou da potência -, a energia que nos leva, que antes de seguirmos os nossos passos se apresenta, se antecipa. Estaríamos materialmente antecipados no tempo.

Mesmo uma fórmula matemática, várias delas que nos faz pensar em blocos, não estão como um rascunho definido, um espelhamento. É necessário conhecer como funciona a fórmula para nos libertarmos de sua organização estrutural, necessário que a separamos em pedacinhos mínimos para que possamos juntá-la e realizarmos a lembrança de como se estabelece e, ainda mais podermos usá-la.

Nada é em nossa mente a resposta de um guardado, como que num arquivo. Ao contrário, tudo se dispersa e se assoma, se une com outros conhecimentos, com as emoções, com aquilo que nos afeta, nos marca, traça um caminho sináptico, com a afetividade. Razão e emoção são a base do processo de lembrança, de recordarmos dias, datas, tempos, idéias, pensamentos, são essas categorias que nos sensibiliza, que nos faz entrar no mundo desconhecido, mesmo que visto, um mundo ainda ser explorado, sempre a ser redescoberto com outra ênfase, outra qualidade.

A velocidade do pensamento é imenso, são saltos absurdos sobre abismos, sobre incertezas, e sobre verdades que acreditamos, e sobre as dúvidas, sobre o que questionamos. E é tão rápido esse choque sináptico, essa velocidade luminosa que por fim, como Parmênides, construímos o movimento da nossa carruagem de idéias bem na frente de todo relâmpago que, certamente Einstein percebeu ser verdade ou ser possível.  A individualidade abstrata com verdade sem fim de validade.

As formas internas se transformam porque o parque de diversões existencial, tudo o que colidimos com o nosso olhar se desvanece em micro verdades, estão ali naquele estado concentrado o nosso legado arqueológico, nosso cômputo sensorial que mais que não desejemos que funcione está em ação, faz mais o que anteriormente em um passado remoto comunitário, comum de nós mesmos tenhamos esses sinais que se tocam energeticamente o tempo todo nos caminhos, nos trilhos, nas trilhas sinápticas em permanente ação.

A nossa filogênese, essa amizade que vem desde o início, e tudo o mais que aprendemos nas formas malucas do compartilhar, de dizer o que achamos o que quer que seja, em que mostramos existir por nossa experiência, e que dizemos como uma verdade definitiva, isso é um cachimbo, uma formalidade, etiqueta da representação social, reestruturação, um fenômeno presente na vida a partir de nossa intervenção.

Somos por isso ontogenéticos, de um ser singular que se faz no tempo como aquele que de si, ao se derivar, completa-se com o outro, que produz portanto para o outro e que, com isso, salvaguarda a si mesmo e ao outro com algum conhecimento, e, que enfim, ao outro e ao em si mesmo radica uma vontade superior de bem a compartilhar.

Em razão do que o ser, a sua existência única se realiza na inteireza com o possível, com o outro, com a alteridade. O ser do discurso, da linguagem que se intercambia com a propriedade das coisas e do ser mesmo. Busca-se a natureza informe das coisas e dos seres, seja enquanto humanidade, no estado de ser heideggeriano, aí.

A teoria da totalidade provém dessa relação metafísica, algo além da materialidade propriamente que se constitui da idéia platônica, um pensar além do visto fenomênico, isto é, além do que se mostra, da empiria ou da prática definida na experiência que produz o conhecimento, como no trabalho, em que todo ante-trabalho se realiza no processo, esse antes de realizar o feito, de se fazer vontade no trabalho.

Isso nos leva à teoria atomista, de que somos seres que jamais estanques, sempre em movimento, feitos da atividade e com a atividade processamos esse fazer criativo do mundo como ônticos, próprios do ser. Somos o que fazemos, com o que fazemos ao mesmo tempo, antecipando ideologicamente o feito, uma metafísica na materialidade, a teoria da atividade.

Seres ontológicos, pesquisadores porque questionadores do mundo, somos, como nos mostra Vygotsky seres ativos, ontogenéticos, sempre em processo. Claro que se pensava, o que é pertencente ao pensamento é algo que secreta outros pensamentos, ao ir ao mundo, ao ver e sentir, perceber, ao construir a memória do que penso ser, se cria esse pensar-querer-ser no mundo que, apesar de me pertencer é o mundo que se transforma em mim, que está aferrado em minha presença como ser do mundo e feito mundanamente de mundos.

A arte (techne) é menos técnica de resultados do que metafísica do não-ser. Não pode ser de outra forma porque se processa em muitos olhares, muitas visões do que pode ser, uma ética, uma vontade decidida de acolher o ser-do-mundo-arte, porquanto seja estanque é plástica, se movimenta no teatro e atua na linguagem, no estado de conhecer. E se volta à arte a quem a percebe, se afeta por sua afetividade. Ao questionar a arte convocamos o sentido filogenético de sermos paridade histórica, presente no memorial da vida, e da mesma forma por nos ser compartilhada como uma verdade-pergunta não concebemos desse ser no mundo o que nos toma senão que seja um sinal, um signo do possível.

As razões da arte estão no sensível por onde atua, as emoções. O que se mistura, o que nos alimenta, o que nos identifica como seres de próprio sangue, e o que nos faz agir sobre o manto das formas dadas, das que foram através do artista criadas nos enleva a querer ser o ser da arte. Ser criativo dispositivo na teia lógica do mundo, salto quântico, qualitativo que se retoma ao nosso pensamento.

E este ser que jamais se desaloja do mundo em que vontade em sua volatilidade, em ser volúvel, quer simbolizar, representar, dar um basta, aceitar o comum materializado, porém, distante de Kierkegaard, não consegue porque a arte plasma outras ingerências, outras facticidade em uma transcendência no real-material em que se apresenta.

No ato da fala do ator, na cor, nas distopias temporais do fotograma, da imagem reprodutiva da tecnologia, distante de suas moralidades, de suas normativas procedimentais, da estrutura definida, da forma que se mostra na teia ramificada do pensamento. A razão não suporta a razão, por isso a dispensa, e sempre de modo diferente, como a memória dita, a lembrança de algo que é sempre novo na expressão incógnita ou incerta da expressividade humana.

A presença humana, tal como um gesto, é a secreção constante da experiência, da vida emotiva, da afetividade, e a arte é o portal que se antepõe ao imanente, ao princípio definido, ao fim garantido. O que emana é o gesto humano, porém, nunca completo, ou de todo compreendido.

O cultural social, as relações e interações são o que produzem em nossa internalidade os caminhos neuropsíquicos do entendimento, produz traços sinápticos, a modelagem cerebral, e o desenvolvimento do pensamento.

O homem não é a arte, o homem não é o proprietário da arte, isso porque a arte provém do homem e o alimenta, o provê, faz caminho (e não um certo caminho sinalizado) que o leva para além dos esquemas concebidos das formalidades, do racionalismo lógico, das certezas absolutas. O pensamento é todo social, de onde vem, da cultura de onde se manifesta, surgido das relações e interações humanas, sempre variáveis, díspares, retomadas como verdades possíveis e não de determinismo finalista, certezas teleológicas cuja finalidade me definiria como alguém útil, lumpen (disposto a dar a minha luz por migalhas ideológicas, de certezas medidas na balança doutrinária).

Seria assim, uma finalidade antes de ser princípio,  liberdade cooptada pela nudez de formas e bandeiras, coisificado a que se possa dizer quem se é como definição cognata por analogias e comparatividade. Seria a reprodutividade, homogeneizada condição, estanque ao dever sem direitos, um ser social de Lukács, de tal forma imerso ao formalismo etiquetário das recompensas que mais não seria.

Porém se sabe que não se é nada disso, que se sabe porque se duvida que seja, porque a arte nos encontra, e nos abandona, abre caminho e o encerra, e nos leva adiante da burocracia, dos cartéis, dos grupos e dos ditadores de outdoor, nos põe em outro lugar, o lugar da transcendência. Retomar o dito, voltar sobre a configuração idiossincrática que nos apresenta, não mais que atores sociais, sujeitos-definidos, previsíveis que arriscam tudo para sair do lugar em que nos encontramos, o ser como ponto referencial do que já está conhecido, inovador - mesmo que reagrupa o óbvio -, alma reificada.

O pensamento não nos pertence, o que pensamos é sempre retomado, elevado ao possível. E é sempre a dúvida que assim nos atinge, como que nos pusesse entre certezas em busca de que possamos escolher. A arte nos leva para o lugar distante no imediato de um presente. A nossa volta ao estado do agora, pode ser uma frustração, o mal-estar da civilização que Freud faz mostrar essa dicotomia entre a produção capitalista, o processo civilizatório e a vida social, da horda, do bicho-homem, de sua cultura.

Essa contradição, essa perda da natureza e um desejo recíproco de retorno à sua potência acaba por nos fazer pessoas submissas, desapegadas de nossa organicidade. Da mesma forma, e com outro ímpeto. A transcendência que a arte possibilita também causa ao nosso retorno um sofrimento, nos traz de volta a um mundo impotente, fragilizado, um mundo reificado.

Esse transcender significa que a materialidade da arte enquanto lugar do acontecimento nos põe na paisagem de sua realização. A arte pergunta, insiste que aprendamos, que busquemos saltar as lógicas para alcançar o labirinto, como que a experiência artística produzirá energia, e nos levará adiante do presumido.

Leva-nos a saltar sobre o nosso conhecimento para a liberdade, lugar onde podemos aprender para sermos livres através de nosso caminhar, de nossos passos, a produzir o fascínio de nossa transformação. A arte nos põe fora da subsunção no trabalho, de que o nosso modo, nosso comportamento se integre às regras exigidas do trabalho, que alimentamos isso que, sendo maior que nós, nos atinge, e nos submete.

Voltar ao trabalho, ao mundo regrado do racionalismo gestivo, administrativo, ao feudo das normativas uniformes, do comportamento esperado da vida social, das ordens definidas comuns da vida comunitária. A arte nos liberta dessa humanidade, entre-fronteiras, demarcado. Nos livra dos suseranos.

Mas não passamos a vida dentro do universo da arte como apreciadores como alguém que transcende a presentidade da obra artística. Temos que retornar, voltar ao cotidiano das coisas feitas. O choque do retorno talvez seja, quando estivermos fora do teatro, da galeria, mais violento que a nossa prisão política, da vida sem discussão, do quieto clientelismos das relações, da vida dividida e imobilizada pela estupidez física das armas, da ingerência do estado, da crueldade de seus atos.

Há, portanto, em tudo que seja em nós sensível, artístico, que nos toca os sinais de nossa concebível presença social. Somos as vozes dos outros transtornadas em nós. Remodeladas no barro de nosso pensamento. E o que amamos não atinge aos demais com a mesma potência, isso por que, como sujeitos da atividade, atuamos como seres de escolhas.

O que vemos difere da visão do outro. O que faz a arte objeto são as objetivações das pessoas, e o que faz dela arte em si mesmo são as pessoas da qual ela trata. A arte não trata a si mesmo como objeto, qualquer ação humana é humanamente para todos.

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Charlie





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